O crescimento do nacionalismo digital ameaça dividir a Internet global
- A ascensão de um modelo de Internet autoritário, com cidadãos segregados do restante da rede global e sujeitos a uma ampla vigilância, apresenta um risco real para a Internet aberta e acessível que conhecemos. É assim que a Internet funciona na China, e outros países têm adotado medidas semelhantes para construir muros digitais em suas fronteiras nacionais. A Rússia já caminhava nessa direção antes das restrições à Internet que acompanharam a invasão à Ucrânia.
- No momento em que legisladores de todo o mundo elaboram novas regulamentações de Internet extremamente necessárias, uma preocupante onda de nacionalismo digital tem invadido o debate. Discursos sobre “soberania digital” e “localização de dados”, defendendo o direito de uma nação de interromper ou limitar o livre fluxo de dados internacionais, se tornaram comuns. E, cada vez mais, essas ideias dão margem a novas leis. Com isso, os princípios da Internet aberta vão sendo abalados, já que ela se baseia no fluxo de dados entre países.
- Para os governos, reivindicar mais soberania sobre os dados é um impulso natural e compreensível. Muitos são atraídos pela ideia de que a construção de muros digitais em suas fronteiras nacionais pode impedir que os dados gerados por seus cidadãos sejam supostamente extraídos por interesses internacionais poderosos. Eles, por sua vez, podem tratar os dados como se fossem reservas de petróleo e impedir que eles sejam exportados.
- Contudo, essa ideia ignora os benefícios de rede e agregação gerados pelos fluxos de dados internacionais, que são fundamentais para o modo como a Internet funciona.
Dados não devem ser confundidos com petróleo
- O apoio ao nacionalismo digital é resultado da falta de entendimento sobre os dados e sobre como eles geram valor.
- Um dos equívocos mais perigosos em relação aos dados, em termos de definição de políticas, é o de que eles são o “novo petróleo”: um recurso escasso que deve ser acumulado, enriquecendo aqueles que detêm a maior parte. Mas os dados não são um bem finito. Na verdade, são algo completamente diferente.
- Os dados oferecem um benefício tanto comercial quanto social. Mas isso não é tão simples como pensar que “mais dados significam mais valor”. Eles são um bem que não precisa ser disputado, pois não se esgotam depois de consumidos. O petróleo queimado não volta nunca mais. Já um dado, depois de usado, ainda existirá para ser utilizado novamente.
- Ter uma grande reserva de dados não é, por si só, algo particularmente valioso. É o que você faz com eles que conta. Seu valor é resultado da qualidade das informações que eles podem produzir. Sua capacidade de circular e fluir entre fronteiras é fundamental para o modo como eles criam valor.
A Internet precisa de proteções, não de entraves
- O risco que enfrentamos é de que, à medida que o nacionalismo digital reconfigura cada parte da Internet, a natureza básica da rede seja alterada. Com cada nova restrição nacional, a Internet se torna um pouco menos livre, e a economia digital se torna um pouco mais limitada. Assim, a Internet autoritária vai lentamente substituindo a Internet aberta.
- Os países democráticos precisam reconhecer e ativamente promover e defender a ideia de uma Internet aberta.
- Dados não são petróleo, e isso significa que aqueles que querem criar sistemas para garantir que os dados sejam gerenciados de forma adequada e responsável precisam mudar o pensamento sobre eles. É perfeitamente possível desenvolver sistemas para maximizar os benefícios da economia de dados e, ao mesmo tempo, minimizar os possíveis danos.
- O desafio é elaborar novas regras que tirem proveito dos grandes benefícios que as tecnologias orientadas por dados oferecem à sociedade e à economia dos países, ao mesmo tempo protegendo as pessoas e a privacidade. Quanto mais isso puder ser feito em nível global, melhor, pois assim evitamos a criação de divisões e barreiras nos fluxos contínuos de dados que tornam possível a Internet aberta.